MARTINS DOS SANTOS
APONTAMENTOS DE
HISTÓRIA DE PORTUGAL
BRAGA - 1999
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ÍNDICE
INTRODUÇÃO
O território de Portugal, antes da independência,
fazia parte do Reino de Leão, que ocupava o nordeste da Península
Ibérica, ao tempo ligado ao Reino de Castela, pois o mesmo
monarca era o soberano dos dois reinos vizinhos. Castela, porém, não
tinha fronteiras com Portugal.
Entre o ano 1090 e 1095, o rei estabeleceu ali dois
condados com administração autónoma, o de Galiza e o de Portugal, que
foram entregues a dois dos seus genros, primos e ambos oriundos da Casa
de Borgonha (Dijon, França), D. Raimundo, na Galiza, e D. Henrique,
em Portugal.
Os dois genros morreram antes do sogro comum. A
condessa da Galiza, D. Urraca, ficou a ser a rainha de Leão e Castela, e
queria que sua irmã D. Teresa, condessa de Portugal, se
considerasse sua súbdita, e isso ela não o aceitou, pois considerou-se
desde logo independente.
O filho de D. Henrique e D. Teresa, D. Afonso
Henriques, com o apoio do Papa Inocêncio II, conseguiu que D. Afonso VII,
rei de Leão e Castela, seu primo, em 1143, reconhecesse a independência
de Portugal. Nessa altura as duas irmãs tinham já falecido.
PRIMEIRA DINASTIA
DA CASA DE BORGONHA
D. AFONSO I — (CONQUISTADOR)
Damos habitualmente a este monarca a denominação de
D. Afonso Henriques, por ser filho do Conde D. Henrique.
Antes de ser reconhecido como rei, em 1143, teve de
lutar com sua mãe e com seu primo, D. Afonso VII, de Leão e Castela.
Dedicou-se com grande empenho ao alargamento do
território, conquistando terras aos mouros, que ocupavam parte da
Península Ibérica, também por conquista, havia mais de quatrocentos
anos. Esta actividade mereceu-lhe o cognome de Conquistador.
Ocupou Lisboa (auxiliado pelos cruzados), Santarém, Sintra, Almada,
Palmela, Alcácer do Sal, Évora e Beja.
Tal como os seus sucessores, aproveitou os serviços
das ordens monástico-militares, para combater os sarracenos e para
desenvolver a riqueza do País, que se baseava na agricultura. As mais
famosas foram a Ordem do Templo (depois de Cristo), com
sede em Tomar, a Ordem de Santiago, com sede em Palmela, a
Ordem de Calatrava, com sede em Avis, e a Ordem do
Hospital (ou de Malta), com sede no Crato.
Protegeu a fundação de diversos mosteiros, a maior
parte deles na região entre os rios Minho e Mondego, sobretudo
beneditinos e do ramo cisterciense; seu pai dera preferência ao ramo
cluniacense. No seu tempo construiu-se o importante Mosteiro de Alcobaça,
um dos mais célebres monumentos religiosos de Portugal, a sua igreja é a
maior do País.
Fez casamento com uma princesa italiana, D. Mafalda
de Sabóia e Piemonte.
Governou desde 1128 até 1185.
D. SANCHO I — (POVOADOR)
Continuou a actividade de seu pai, procurando alargar
o território português. Conquistou também diversas cidades, sendo a mais
importante a de Sines, no Algarve.
O seu principal objectivo, como governante, foi
aumentar a população, oferecendo vantagens aos cruzados que passavam
pelos nossos portos, para aqui se fixarem. Isso explica que seja
conhecido com o cognome de Povoador. Alguns escritores brincam
com isso, devido a ter bastantes filhos, tanto legítimos como
ilegítimos, aumentando a população com os descendentes.
Três das suas filhas (D. Mafalda, D. Sancha e D.
Teresa) distinguiram-se como freiras muito virtuosas, tendo sido
beatificadas, são consideradas santas. D. Teresa foi ainda durante algum
tempo rainha de Leão.
No tempo de D. Sancho começaram grandes lutas
políticas entre o rei e os principais fidalgos contra alguns bispos
portugueses, que se prolongaram durante quase cem anos; no fundo, estava
em causa a cobrança dos impostos, consequentemente a preponderância da
influência política e económica, que nesse tempo estava muito nas mãos
do clero; os reis pretendiam subtrair-lha.
Casou com a princesa D. Dulce de Aragão e Catalunha
(regiões da parte oriental da Espanha).
Governou Portugal desde 1185 até 1211. Antes de ser
rei seu pai tinha-o já associado à administração do território.
D. AFONSO II — (GORDO)
A História de Portugal dá-lhe o nome de Gordo
por ser, realmente, muito obeso.
Continuou a política de seu pai e seu avô, conquistar
terras e aumentar a população. Ocupou pela última vez diversas cidades
que os mouros tinha reconquistado, sendo a mais famosa a de Alcácer do
Sal. À semelhança do que eles tinham feito, aproveitou-se do auxílio que
os combatentes da Cruzadas do Oriente lhe puderam prestar na guerra
contra os mouros.
Continuou a luta contra o alto clero, sobretudo os
bispos; e também teve lutas com os irmãos, sobretudo com as irmãs, não
querendo entregar-lhes os bens que seu pai lhes legara para sua
manutenção, pretendendo juntar nas mãos do monarca todos os poderes e
todas as riquezas que fosse possível reunir. Por causa disso teve até
guerra com o rei de Leão, seu cunhado. Começava já o período do
absolutismo régio.
Procurou fazer o inventário de todos os bens da
coroa, as chamadas "Inquirições", para retomar os que haviam sido
abusivamente subtraídos e evitar a usurpação futura.
Casou com a princesa D. Urraca de Castela e governou
o País de 1211 a 1223, portanto durante doze anos.
D. SANCHO II — (CAPELO)
Damos a este rei o epíteto de Capelo porque
sua mãe, que era muito devota, durante uma doença, fez a promessa de o
vestir com o hábito de frade, parece que franciscano. Uma banalidade!
Era ainda muito novo quando subiu ao trono. Depois de
D. Afonso Henriques, foi o rei que mais alargou as fronteiras de
Portugal. Ocupou Mértola, Alcoutim, Castro Marim, e outras terras,
seguindo o rio Guadiana, que lhe dava protecção a leste.
Os bispos continuaram a luta que vinha dos reinados
anteriores e fizeram graves acusações ao Papa (acreditando-se que a
maior parte delas eram injustas ou pelo menos muito exageradas).
Inocêncio IV, em 1245, tirou-lhe o governo de Portugal e entregou-o a
seu irmão Afonso, que residia em Bolonha, na França de hoje. Na mesma
ocasião destituiu também o imperador da Alemanha, Frederico II.
Isso ainda ocasionou lutas intestinas durante três
anos, pois D. Sancho II tinha alguns partidários fiéis. No entanto, saiu
de Portugal e retirou-se para a cidade de Toledo, capital de Castela,
onde morreu.
Diz uma lenda que o alcaide de Coimbra foi
expressamente a Toledo e fez desenterrar o rei, para se certificar de
que tivesse morrido, e só no regresso entregou a cidade!
D. Sancho II casou com uma fidalga castelhana, já
viúva, D. Mécia Lopes de Haro, que por causa da guerra também saiu de
Portugal, mas não acompanhou o marido, não sabemos bem o motivo. D.
Sancho II foi rei desde 1223 a 1248.
Como não teve filhos, o sucessor foi seu irmão
Afonso. Foi o primeiro caso de sucessão régia anormal em Portugal.
Adiante encontraremos outros.
D. AFONSO III — (BOLONHÊS)
Recebeu esta denominação por ter sido Conde de
Bolonha, na França actual, como marido da titular nobiliárquica, D.
Matilde de Bolonha e Dammartin.
Custa a entender a posição do alto clero, pois a
esposa do rei, D. Matilde, não quis vir para Portugal e ele criou a
situação anormal de "bigamia", fazendo contrato nupcial com a princesa
D. Beatriz de Castela, que ao tempo tinha menos de dez anos de idade e
veio logo para Portugal (embora não fizessem vida marital). E,
por estranho que pareça, segundo o que se acredita, os bispos não lhe
fizeram qualquer oposição!
Como curiosidade, diremos que seu sogro era muito
mais novo do que ele, uns dez ou onze anos.
Continuou a política dos reis anteriores, que se
resumiu em conquistar terras aos mouros (foi este rei que terminou a
ocupação do Alentejo e do Algarve), em desenvolver a riqueza
agrícola de Portugal e em fazer as pazes com os bispos, podendo dizer-se
que as lutas com o clero quase acabaram no seu reinado.
Procurou ampliar a cultura intelectual, tendo criado
condições favoráveis à actuação dos trovadores provençais, que ele
apreciava e protegia.
A rainha D. Beatriz notabilizou-se pelas suas
excepcionais qualidades. D. Afonso III ocupou o trono português, como
rei, desde 1248 até 1279.
D. DINIS — (LAVRADOR)
Recebeu esta denominação, Lavrador, devido a
ter prestado grande dedicação ao desenvolvimento da agricultura.
Realmente, o seu principal empenho foi aumentar a riqueza do País, que
ao tempo se baseava nos produtos do campo.
Entre as suas medidas mais notáveis conta-se a
sementeira do pinhal de Leiria, propriedade real.
Começou a interessar-se também pelo desenvolvimento
do comércio marítimo e aperfeiçoamento dos processos de navegação.
Contratou marinheiros italianos para virem trabalhar em Portugal e fez
convénios comerciais com outros monarcas.
Também a instrução lhe mereceu grande cuidado. O
interesse pela cultura foi intensificado já no tempo de seu pai, que
tinha contactado com meios mais avançados e procurou logo fazer com que
em Portugal houvesse gente instruída. Todavia, foi D. Dinis que, em
1290, com o apoio do Papa, criou a primeira universidade portuguesa, a
famosa Universidade de Coimbra. Começou a usar-se a língua
portuguesa nos documentos escritos.
No seu tempo foi extinta a Ordem do Templo e criada a
Ordem de Cristo.
D. Dinis casou com a princesa D. Isabel de Aragão,
sendo ela ainda muito criança. Deixou nome pelas suas excepcionais
virtudes, sobretudo pelo interesse que lhe mereceu a paz. Portugal
conhece-a por Rainha Santa e também por Rainha Santa Isabel.
Sendo bom rei, D. Dinis era menos escrupuloso neste
ponto, lançou-se em guerras por motivos que parecem pouco
justificativos, pois teve lutas com o irmão e com o filho; no entanto,
deveriam ter tanta culpa como ele.
Ocupou o trono desde 1279 a 1325.
D. AFONSO IV — (BRAVO)
A História deu-lhe este cognome, Bravo, por
ter mostrado grande valor guerreiro na batalha que os exércitos de
diversos reis cristãos travaram contra as tropas sarracenas, nas margens
do rio Salado, no sul da Espanha. Alguns autores dão-lhe outro nome,
chamam-lhe batalha de Tarifa.
No princípio do reinado teve dura luta com um seu
irmão bastardo que pretendia ocupar o trono.
O facto mais notável do seu reinado foi o da
condenação à morte, pelo rei, e a execução de D. Inês de Castro, não
sendo propriamente atitude ou iniciativa judicial, foi mais uma medida
administrativa ou governativa. Sofreu a morte em atenção às chamadas
razões de Estado, por motivos que muito se parecem com os conluios
políticos...
Promoveu o progresso de Portugal, sobretudo no
aspecto comercial, melhorando a frota marítima e fazendo tratados de
comércio com alguns reis estrangeiros, nomeadamente os da Grã-Bretanha.
Há quem afirme que os portugueses começaram neste tempo as viagens
marítimas de longo curso, tendo atingido o arquipélago das Canárias, mas
isso não está suficientemente documentado.
Casou com a princesa D. Beatriz de Castela, que
mostrou ser senhora de grandes qualidades, como aconteceu com as outras
duas rainhas que a antecederam.
Governou Portugal desde 1325 a 1357.
D. PEDRO I — (JUSTICEIRO)
Este rei tornou-se particularmente conhecido devido
ao que se passou com a fidalga com quem casou, D. Constança de Castela,
e com D. Inês de Castro com a qual jurou ter casado em segredo (e
isso deve ter sido fantasiado).
Para contrair matrimónio com D. Constança, D. Pedro
teve de enfrentar a má-vontade de seu sobrinho, o rei D. Pedro I de
Castela, que a não queria deixar vir para Portugal. Ainda em vida de D.
Constança, que morreu cedo, prendeu-se de amores com aquela dama de
honor; seu pai D. Afonso IV mandara matá-la por razões de Estado, e tal
facto ocasionou uma guerra civil.
O episódio terminou com a troca de exilados, feitos
prisioneiros, entre os dois monarcas do mesmo nome e de feitio muito
parecido, tio e sobrinho, e a execução horrendamente bárbara de dois
implicados na morte de D. Inês de Castro. Ainda se lhe aponta a tétrica
cerimónia do beija-mão ao cadáver, que muitos consideram lendária.
Este caso levou o rei D. Pedro a mandar construir
dois belos monumentos mortuários, um para D. Inês e outro para ele;
encontram-se na igreja do mosteiro de Alcobaça, e são os mais perfeitos
exemplares da arte tumular portuguesa.
A vingança exercida contra os prisioneiros e outros
actos de castigo de criminosos fizeram com que lhe fosse dado o cognome
de Justiceiro, que alguns autores substituem por Cruel.
D. Pedro sofria de perturbações psíquicas, tendo por
vezes grandes insónias e comportamento estranho. Costumava juntar-se aos
plebeus, acompanhando-os nas suas danças e cantares, confraternizando
com eles nas ruas e praças lisboetas.
Prosseguiu a obra dos seus antecessores, procurando
desenvolver a economia nacional, aumentando a riqueza do País.
Foi rei desde 1357 a 1367, portanto durante dez anos.
D. FERNANDO I — (FORMOSO)
Interessou-se muito pelo fomento da riqueza nacional,
prestando especial atenção aos problemas da agricultura e da marinha,
que protegeu com a instituição dos nossos primeiros organismos de seguro
e previdência.
Cometeu o grave erro de se intrometer demasiadamente
nos negócios políticos da Castela, que estava já unificada com Leão,
ambicionando tornar-se seu rei. Isso nos arrastou por três vezes para a
guerra, que sempre nos foi desfavorável.
Nos diversos tratados de paz, foi considerado por
várias vezes o problema do seu casamento, sempre frustrado. Veio a
ligar-se com uma senhora portuguesa, já casada, D. Leonor Teles,
afirmando que se matrimoniaram em segredo (e isso causou grande
descontentamento no povo de Lisboa, com manifestações que o rei reprimiu
com a morte dos seus promotores).
No seu tempo, Portugal assinou um tratado de amizade
e cooperação com a Grã-Bretanha, ainda hoje em vigor, que passa por ser
o de maior durabilidade em todo o mundo, a aliança inglesa.
A sua reconhecida beleza física fez com que os
historiadores o chamassem Formoso (havendo até alguns a
classificá-lo de Inconstante, e Luís de Camões chamou-lhe "brando,
remisso e sem-cuidado").
Foi atacado por uma doença que poderia ser a
tuberculose e morreu sendo ainda muito novo.
Governou Portugal de 1367 até 1385. Poucas semanas
antes de morrer, sua filha D. Beatriz, ainda criança de uns doze anos,
casara com o rei D. João I de Castela, e isso arrastou o País para nova
guerra, com a vitória de D. João, Mestre de Avis, que garantiu a
continuação da independência.
PRIMEIRA DINASTIA
SUAS CARACTERÍSTICAS

Luta contra os leoneses e contra os mouros, tendo em
vista a consolidação da independência e o alargamento do território.
Resistência dos bispos aos monarcas e consequente
oposição, com o objectivo de alargarem a influência e o poderio.
Aproveitamento das congregações religiosas e das
ordens militares para fortalecimento da posição política.
Guerra entre reis e seus próximos parentes, algumas
vezes filhos bastardos, por motivo da sucessão no governo.
Preocupação pelo desenvolvimento nacional, através do
povoamento, agricultura, pesca e comércio.
Começo das preocupações quanto à difusão da cultura,
primeiro com as escolas conventuais, depois com a Universidade.
INTERREGNO — (1383-1385)
Quando morreu D. Fernando, sua filha D. Beatriz,
muito criança ainda, estava já casada em Castela. Por esse motivo,
assumiu o governo do reino sua viúva D. Leonor Teles.
Esta senhora dava exagerada aceitação a um fidalgo da
Galiza, e isso desagradava muito aos habitantes de Lisboa.
O Mestre de Avis, D. João, filho bastardo de D. Pedro
I, assassinou-o. Vendo-se em perigo, a rainha viúva saiu de Lisboa e foi
para Castela.
O povo escolheu o Mestre de Avis, D. João, para
administrar o reino e tratar da defesa contra as tropas castelhanas, que
em breve invadiram Portugal.
O principal chefe guerreiro deste período foi D. Nuno
Álvares Pereira, que obteve diversas vitórias — Atoleiros, Aljubarrota e
Valverde. Foi na batalha de Aljubarrota que Portugal consolidou a sua
independência, separado de Castela.
Houve um jurista que muito se distinguiu pela acção
desenvolvida, João das Regras ou João das Leis, sendo ele quem preparou
a aclamação do Mestre de Avis, que ascendeu ao trono e ficou a ser o rei
de Portugal.
Para se decidir sobre tão importante problema, foram
convocadas as Cortes de Coimbra, sendo no final delas que D. João de
Avis foi aclamado rei e pôde subir ao trono.
(João das Regras demonstrou que D. Beatriz era filha
ilegítima, pois D. Fernando não poderia ter casado com D. Leonor Teles;
demonstrou ainda que os dois filhos de D. Inês de Castro, D. João e D.
Dinis, também eram ilegítimos, porque D. Pedro, apesar de o afirmar sob
juramento, não casou com ela; sendo forçoso escolher um filho bastardo
para rei, o Mestre de Avis era o que mais convinha, o que melhores
provas tinha dado, o que oferecia maiores garantias. Não deixa de ser
estranho que o clero não interferiu decisivamente numa questão que tinha
muito de natureza religiosa).
SEGUNDA DINASTIA
DA CASA DE AVIS
D. JOÃO I — (DE BOA MEMÓRIA)
Consolidou a sua posição no trono e,
consequentemente, firmou a autonomia nacional portuguesa com a guerra
que travou contra o rei de Castela, marido de D. Beatriz de Portugal,
também chamado D. João I.
Confirmou a aliança de D. Fernando com o duque de
Lencastre, da Inglaterra, que sustentava direitos sobre a coroa de
Castela, recebendo valioso auxílio na Guerra da Independência.
Para comemorar a mais importante batalha e o maior
triunfo, mandou construir o Mosteiro de Santa Maria da Vitória,
vulgarmente designado por Mosteiro da Batalha, onde hoje existe a
cidade deste nome, perto de Aljubarrota, local da peleja. Ali está
sepultado com boa parte da sua família.
Iniciou a expansão ultramarina nacional, com a
conquista de Ceuta e com o descobrimento da Madeira e dos Açores. Isso,
de certo modo, dava continuidade à tradição portuguesa, prosseguindo a
luta contra os mouros no norte de África e dando maior expansão às
actividades náuticas.
Contraiu matrimónio com D. Filipa de Lencastre, em
resultado da aliança inglesa; outra irmã de D. Filipa veio a ser rainha
de Castela. Esta rainha-cônjuge de Portugal foi talvez, entre todas, a
que mais se salientou — pelas suas grandes virtudes e pelas invulgares
qualidades dos seus numerosos filhos, "ínclita geração, altos
infantes", D. Duarte, D. Pedro, D. Henrique, D. Fernando, D. João e
D. Isabel.
Foi dada a D. João I a honrosa denominação de "Rei
de Boa Memória" pela sua administração modelar, por ser monarca
muito prestigioso e individualidade dotada de grande mérito. Era
invulgarmente culto, chegou a escrever livros muito interessantes,
tratando temas intelectuais e actividades a que se dedicavam as famílias
da nobreza, nomeadamente a caça e a equitação.
Governou Portugal, como rei, desde 1385 a 1433.
D. DUARTE — (ELOQUENTE)
Teve um reinado muito curto, e cheio de contratempos
que muito o fizeram sofrer.
Continuaram as tentativas de expansão portuguesa, por
via marítima, tendo sido atingidos na costa ocidental da África o Cabo
Bojador e a Angra dos Ruivos.
Tentou-se a conquista da cidade de Tânger, importante
praça forte de Marrocos, onde o exército português foi vencido, tendo
seu irmão D. Fernando ficado prisioneiro dos mouros na situação de
escravo; ficou sendo conhecido por Infante Santo.
Tomou medidas de fortalecimento do poder real, dando
seguimento a iniciativas de seu pai. Estava então a começar a radicar-se
com vigor o absolutismo régio.
Portugal foi atingido por algumas epidemias, que
fizeram muitas vítimas, tendo falecido o próprio monarca.
Era muito culto, com os estudos feitos adquirira
grande ilustração intelectual. Assim se explica que seja ainda hoje
conhecido por Eloquente, mas talvez fosse mais exacto dar-lhe o
título de Erudito
Escreveu alguns livros de feição filosófica, a
que se atribui os títulos de "Leal Conselheiro", "Arte de Bem
Cavalgar" e "Livro das Misericórdias".
Casou com a princesa D. Leonor de Aragão, que por sua
morte ficou a governar o País, tendo criado descontentamento entre a
nobreza de Portugal, que evoluiu para tragédia a que faremos referência
no reinado de D. Afonso V, filho do casal. Todavia não pode atribuir-se
a D. Leonor toda a culpa do facto, pois outros a tiveram em maior grau.
D. Duarte foi rei de 1433 a 1438, durante curtos
cinco anos.
D. AFONSO V — (AFRICANO)
Era muito pequeno quando seu pai faleceu, pelo que
ficou a governar sua mãe e depois seu tio D. Pedro. A nobreza de
Portugal entrou em luta; o rei, já então a governar, não soube ou não
quis evitá-la, antes se intrometeu estupidamente nela, chegando a lutar
com as forças de D. Pedro, seu sogro, que sucumbiu ingloriamente no
combate de Alfarrobeira, em 1449. Só as intrigas da corte podem fazer
admitir a vileza do procedimento de alguns fidalgos.
Ainda teve a presunção de se apoderar da coroa
castelhana, pensando em casar com a filha do monarca falecido, sua
sobrinha; para tal entrou em guerra com os Reis Católicos, que terminou
com o desaire sofrido pelas suas tropas na batalha de Toro.
D. Afonso V recebeu o epíteto de Africano por
no seu tempo haverem sido ocupadas diversas localidades em Marrocos,
sendo as mais importantes Alcácer Ceguer, Arzila e Tânger.
Prosseguiu a expansão marítima, mas tal empresa ficou
mal esclarecida, ao tempo havia enorme cuidado em que os acontecimentos
não fossem conhecidos; por isso os ignoramos ainda hoje. A exploração
dos mares do litoral atlântico africano era feita em dependência de
contratos de comércio, e talvez isso explique que se não tenham
divulgado nomes nem realizações, que efectivamente existiram. Podemos
afirmar que se atingiu o arquipélago de Cabo Verde, a Guiné, São Tomé e
Príncipe, o Rio do Ouro, a Costa do Marfim, a Costa da Mina, a Serra
Leoa.
No seu reinado, por iniciativa do Regente D. Pedro,
foi feita a compilação das leis antigas, constituindo as Ordenações
Afonsinas.
Casou com sua prima D. Isabel de Lencastre, filha de
D. Pedro, morto em Alfarrobeira. Sua filha D. Joana notabilizou-se pelas
suas virtudes e foi beatificada — é a Princesa Santa Joana de Aveiro,
também conhecida por Santa Joana de Portugal.
O seu reinado começou em 1438 e terminou em 1481.
D. JOÃO II — (PRÍNCIPE PERFEITO)
No seu reinado realizaram-se as últimas grandes
tentativas de exploração marítima, pois havia interesse em chegar
depressa à Índia, a grande fonte produtora das especiarias. Podemos
referir três expedições de grande importância, as duas viagens de Diogo
Cão, que descobriu a costa de Angola e subiu o rio Zaire, e a de
Bartolomeu Dias, que dobrou o Cabo da Boa Esperança, Cabo das Tormentas
ou Cabo das Tempestades.
Para obter informações sobre a Índia, mandou ali dois
emissários muito competentes, Pêro da Covilhã e Afonso de Paiva; nunca
mais regressaram, mas ainda forneceram indirectamente algumas notícias
de interesse.
Em consequência dos descobrimentos marítimos, feitos
especialmente pelos portugueses e espanhóis, foi assinado em 1494, o
Tratado de Tordesilhas, que dividiu entre os dois povos as terras já
descobertas ou ainda a descobrir.
A nobreza do País continuava a habitual rebeldia, e o
rei fez executar alguns dos seus membros, mesmo seus próximos parentes,
incluindo um seu cunhado, irmão da rainha, o Duque de Bragança, que foi
decapitado. Afirma-se que o próprio rei assassinou outro seu primo, o
Duque de Viseu.
Foi cognominado Príncipe Perfeito por ter
exercido bom governo e ter aumentado a prosperidade de Portugal; os
historiadores de hoje não lhe dariam já tal epíteto.
Casou com D. Leonor de Lencastre, uma das suas
primas, como ele neta de D. Duarte. Do casal nasceu um filho, D. Afonso;
morreu num desastre de equitação, em 1491; tinha dezasseis anos mas
estava já casado com D. Isabel de Castela e Aragão. Este facto motivou a
terceira sucessão régia anormal, pois o rei tinha um filho bastardo e
não quis que fosse rei.
D. João II reinou de 1481 a 1495, portanto catorze
anos.
D. MANUEL I — (VENTUROSO)
Este monarca era irmão da rainha D. Leonor e primo do
rei D. João II. Antes de ser rei teve a dignidade de Duque de Beja.
Foi chamado Venturoso porque ascendeu ao trono
sem se prever (pela morte de D. Afonso e por D. João II não querer
que seu filho bastardo fosse rei) e porque teve o reinado mais
brilhante de toda a nossa História.
Vasco da Gama atingiu a Índia em 1498, comandando uma
frota já preparada pelo seu antecessor.
Pedro Álvares Cabral descobriu o Brasil em 1500. A
armada dirigia-se à Índia, tendo atingido o Brasil por desvio de rota
programado. Não foi este o último descobrimento, mas dos posteriores já
pouco se costuma falar.
A propósito, podemos recordar que descobrimos ainda
as ilhas de Ascensão e Santa Helena, certas zonas da costa dos Estados
Unidos e do Canadá, e diversas ilhas da Oceania.
Para comemorar o descobrimento do caminho marítimo
para a Índia, D. Manuel edificou o majestoso Mosteiro dos
Jerónimos, em Lisboa; foi assim chamado por ter sido entregue à
Congregação de S. Jerónimo.
Construiu-se igualmente a Torre de Belém, que
deveria ser uma fortaleza mas veio a ser uma das nossas mais
interessantes construções arquitectónicas. Vulgarizou-se uma forma de
decoração que nós conhecemos um tanto ou quanto inexactamente por
Estilo Manuelino — pois não chega a ser um estilo definido.
Com o ouro do primeiro tributo cobrado ao potentado
de Quíloa, na costa africana do Índico, foi construída a famosa
Custódia de Belém, que passa por ser o mais perfeito exemplar da
joalharia portuguesa e se diz ter sido executada por Gil Vicente,
certamente o que se distinguiu no teatro.
Iniciámos a ocupação territorial na Índia,
conquistando entre outras as cidades de Ormuz, Goa, Malaca, etc.
Notabilizaram-se aqui, na Índia, muitas
individualidades portuguesas, sendo as principais Vasco da Gama,
Francisco de Almeida, Afonso de Albuquerque e João de Castro.
Foi feita nova compilação de leis, actualizando a
anterior, tendo recebido a denominação de Ordenações Manuelinas.
Neste período começou a empregar-se em Portugal a
nova e revolucionária invenção, a imprensa, utilizada sobretudo para a
edição de livros devotos, em boa parte com a protecção de sua irmã, a
rainha-viúva, D. Leonor (por antonomásia chamada "Princesa
Perfeitíssima").
D. Leonor, viúva de D. João II, fundou a instituição
chamada Irmandade de Nossa Senhora da Misericórdia.
A mesma senhora incentivou a arte de Gil Vicente,
apoiando a sua criação teatral e as suas qualidades histriónicas. E foi
no tempo deste soberano que Garcia de Resende elaborou o seu famoso
Cancioneiro Geral.
D. Manuel umas vezes protegeu e outras vezes
perseguiu os mouros e judeus, sendo levado a isso pelo seu
relacionamento familiar com os Reis Católicos, devido aos seus
sucessivos casamentos com princesas espanholas.
Casou realmente três vezes, sempre na situação de rei
e com princesas castro-aragonesas:
— a primeira esposa era D. Isabel de Castela e Aragão,
viúva de seu sobrinho D. Afonso, atrás referido;
— a segunda esposa foi D. Maria de Castela e Aragão,
as duas filhas dos Reis Católicos;
— a terceira era D. Leonor da Áustria, filha de D.
Filipe I e de D. Joana-a-Louca e irmã do imperador Carlos V e de D.
Catarina, rainha de Portugal, a seguir mencionada..
Ocupou o trono português desde 1495 até 1521,
portanto durante vinte e seis anos.
D. JOÃO III — (PIEDOSO)
No tempo deste monarca começou a decadência nacional;
no reinado de D. Manuel, o prestígio de Portugal tinha atingido o apogeu
e agora, por razões diversas, entrava em declínio. O esforço feito,
quanto a exigências de pessoal, causou o amolecimento, a astenia; e a
abundância de riquezas fáceis e rapidamente adquiridas provocou o
comodismo.
Verificando-se que as praças marroquinas não
ofereciam vantagens e exigiam sacrifícios, começaram a ser abandonadas,
e entre elas Safim e Azamor. Fez-se o primeiro recenseamento da
população portuguesa, com a finalidade de se saber com a possível
exactidão quantas pessoas tinha o nosso País.
Estabeleceu-se um importante tratado com a Espanha, o
de Saragoça, que tratava da posse das ilhas Molucas, que Portugal também
disputava. Fizeram-se os primeiros contactos perduráveis com as terras
do Extremo Oriente, as gentes chinesas e japonesas.
Foi fundada a Companhia de Jesus, grande baluarte
católico que se opunha à difusão do protestantismo, tendo o seu primeiro
convento sido instalado em Lisboa, junto da actual igreja de S. Roque.
Estabeleceu-se o Colégio das Artes, em Coimbra, como instituto de
preparação para o ingresso no ensino universitário.
Introduziu-se a Inquisição em Portugal, pedido que o
Papa não queria atender. Efectuaram-se os primeiros autos de fé. Foi
publicada a primeira lista de livros proibidos e editaram-se obras muito
importantes — Gramática, de João de Barros, Menina e Moça,
de Bernardim Ribeiro.
D. João III, antes de ser rei, teve casamento tratado
com a princesa espanhola D. Leonor, que veio a casar com seu pai. Casou
com uma sua irmã, D. Catarina de Castela e Aragão.
É chamado Piedoso por ser mesmo muito devoto.
Foi rei de Portugal desde 1521 a 1557, ao longo de trinta e seis anos.
D. SEBASTIÃO — (DESEJADO)
Encontramos aqui mais um caso de sucessão régia
anormal, porque D. Sebastião era neto de D. João III e de D. Catarina da
Áustria. Seus pais foram o príncipe D. João e a princesa D. Joana, filha
do imperador Carlos V. Nasceu após o falecimento do seu progenitor e é
uma das razões para ter o epíteto de Desejado. Apontaremos outra
razão no final destas anotações.
Como tinha só uns três anos de idade quando herdou o
trono, governaram o País primeiro sua avó D. Catarina e depois seu
tio-avô o Cardeal D. Henrique, o seu sucessor no trono.
Foi criada a Universidade de Évora, por iniciativa
dos jesuítas e com o patrocínio de D. Henrique, que durante bastante
tempo foi arcebispo desta cidade.
Fez-se a edição das obras de Gil Vicente, Garcia de
Orta e Damião de Góis, e de os Lusíadas, epopeia de Luís de
Camões.
Ao arrepio do que seu avô D. João III tinha feito,
pretendeu estabelecer um império cristão português em Marrocos, tendo
organizado um grande exército para invadir e ocupar esse território,
integrando-se ele mesmo nos quadros do comando. Por erros diversos, e
porque a empresa era demasiado temerária, as tropas lusitanas foram
derrotadas em Alcácer Quibir; o rei desapareceu durante a batalha, nunca
se encontrando o seu corpo e nem se registou o seu nome entre os
cativos. O portugueses esperaram o seu regresso, criando-se assim o
SEBASTIANISMO, que sustentava a crença de que voltaria um dia, numa
manhã de nevoeiro. É a segunda razão para ter o cognome de Desejado.
Pensou-se no casamento com diversas princesas e mais
insistentemente com D. Isabel Clara Eugénia, filha de D. Filipe II, rei
de Espanha, mas nenhum destes projectos se realizou.
Governou Portugal durante dez anos, de 1568 a 1578,
embora o seu reinado se estenda por vinte e um anos, com início em 1557.
D. HENRIQUE — (CASTO)
Encontramos aqui mais outro caso de sucessão régia
anormal em Portugal, pois D. Henrique era tio-avô de D. Sebastião.
Espalhando-se a notícia do desastre da batalha de
Alcácer Quibir, foi aclamado rei e começou a governar. Ele tinha sido
durante muito tempo regente do reino, durante a menoridade.
O seu curto reinado corresponde a um período de
transição entre dois monarcas efectivos, em que ele foi "soberano
interino".
Para se decidir quem poderia ser o seu sucessor,
reuniram-se cortes em Almeirim, que nada resolveram. Alguns autores
atribuem a culpa a D. Henrique, que a não teve, porque estava já muito
doente, por vezes até sem o pleno uso dos sentidos, mesmo em estado de
coma; veio a falecer dessa crise de saúde.
Era ainda muito novo quando foi nomeado arcebispo de
Braga, de onde transitou para Évora e daqui para Lisboa, acumulando o
cargo de regente do reino; voltou a ser arcebispo de Évora, deixando o
lugar vago para ser aclamado rei. Nessa altura tinha já sido nomeado
cardeal, contava sessenta e seis anos de idade e era muito doente.
O curto reinado do cardeal-rei D. Henrique não
regista nenhum facto saliente. A grande preocupação nacional, tanto dos
governantes como mesmo de muitos particulares, era pagar o resgate dos
prisioneiros de guerra. Foi chamado Casto por ser um destacado
eclesiástico e a isso comprometido voluntariamente.
Governou o País menos de dois anos, de 1578 a 1580.
(A posição dos pretendentes ao trono, que
decididamente o disputaram, todos descendentes de D. Manuel I, era a
seguinte:
—D. Isabel (3º filho)>D. Filipe de Espanha,{futuro
rei};
—D. Beatriz (4º filho)>Manuel Felisberto>Carlos de
Sabóia;
—D. Luís (5º filho)>D. António, Prior do Crato;
—D. Duarte (10º filho)>D. Maria de Parma>Rainúncio de
Parma;
—D. Duarte (10º filho)>D. Catarina >D.
Teodósio >D. João IV, rei).
SEGUNDA DINASTIA
SUAS CARACTERÍSTICAS
Período de expansão, continuando a luta contra os
mouros, em Marrocos, e descobrindo novas terras, pelo mar.
Aumento da importância da actividade comercial,
atraindo a Lisboa mercadorias raras e caras, com lucros muito volumosos.
Aproveitamento agrícola das terras encontradas,
desenvolvendo as culturas mais rendosas, sobretudo a açucareira.
Fixação de contingentes humanos, portugueses ou
estrangeiros, nos novos locais de colonização.
Interesse pela manutenção da pureza da fé cristã em
Portugal e sua expansão pelo mundo, a partir dos lugares ocupados.
Crescimento das riquezas, sobretudo as fiduciárias,
com o correspondente aumento do luxo e amolecimento de costumes.
Manifestação da mentalidade humanista, ao lado da
intransigência religiosa católica contra as ideias protestantes.
INTERREGNO — (1580)
Pouco depois de morrer D. Henrique, o rei de Espanha,
D. Filipe II, invadiu Portugal com um poderoso exército.
D. António, Prior do Crato, o preferido pela maior
parte dos portugueses, foi aclamado rei mas começou por sofrer logo
grande derrota junto de Lisboa, na batalha de Alcântara.
Chegou ainda a cunhar moeda em seu nome e teve por
si, durante algum tempo, as ilhas dos Açores. Era apoiado por alguns
países europeus que combatiam a Espanha. Desenvolveu actividade política
e militar, do estrangeiro, pelo menos até 1589.
D. Catarina de Bragança era, pelas leis, quem tinha
melhor direito e maior razão, mas não sustentou as suas pretensões com
grande energia, não eram muitos os que a defendiam, parece que por não
simpatizarem com seu marido.
D. Filipe (I de Portugal e II de Espanha),
logo que lhe foi possível, convocou cortes em Tomar, pelas quais foi
aclamado rei.
Portugal continuava a ser um país separado da
Espanha, portanto independente, e regido por um Conselho de Governadores
ou por um Vice-Rei. Com este título notabilizaram-se duas personagens
muito famosas, uma quase no começo — o Vice-Rei de Portugal,
Cardeal-Arquiduque Alberto da Áustria, que veio a ser genro de D.
Filipe, e a Vice-Rainha de Portugal, D. Margarida de Áustria, no
final do período, pois ocupava o lugar quando se deu a Restauração, em
1640.
TERCEIRA DINASTIA
DA CASA DE ÁUSTRIA
D. FILIPE I — (PRUDENTE)
O reinado de D. Filipe I pouco tem a registar,
bastando dizer que o seu primeiro cuidado foi eliminar os focos
favoráveis a D. António, sendo o principal o das ilhas dos Açores. Foi
chamado Prudente por ter exercido política muito eficiente e
cautelosa.
Diz-se dele que ao mesmo tempo herdou e conquistou o
trono de Portugal, devido a ter mantido as suas posições com o vigoroso
apoio dos soldados espanhóis. Temos de reconhecer, no entanto, que
também em Portugal teve bastantes partidários, praticamente todos
aqueles que não seguiram D. António.
Os duques de Bragança, muito estranhamente,
desinteressaram quase totalmente do problema sucessório,
pertencendo-lhes o mais lídimo direito, face às leis que regulavam a
sucessão real.
Procurou manter a magnificência da corte portuguesa e
até se interessou pela resolução favorável de muitos problemas
governamentais, tanto em Portugal como nas conquistas lusas da América
do Sul, da África, da Ásia e da Oceania.
Criou em Lisboa uma escola profissionalizante. a que
se deu a designação de Aula do Risco, que começou a funcionar em
1594. Deu incentivo a alguns estudiosos da História de Portugal, tendo
sido publicada grande parte, quase a totalidade do repositório
intitulado Monarquia Lusitana.
Era filho de D. Carlos I de Espanha (o imperador
Carlos V) e de D. Isabel de Portugal. Casou quatro vezes, mas
nenhuma das cônjuges foi nossa rainha, faleceram todas antes de ele se
firmar no trono português. Pela sua ordem foram estas as suas esposas:
— D. Maria de Portugal, filha de D. João III e de D.
Catarina;
— D. Maria Tudor, rainha da Inglaterra;
— D. Isabel de Valois, da França;
— D. Ana Maria da Áustria, sua sobrinha, filha de
Maximiliano II.
Foi rei de Portugal desde 1580 a 1598.
D. FILIPE II — (PIO)
Era filho do rei anterior e de sua última esposa, D.
Ana Maria da Áustria.
Os três monarcas espanhóis também reis de Portugal
foram piorando cada vez mais o sistema de governação, para o que
contribuíram as condições gerais, francamente degradantes.
Este soberano foi designado por Pio devida a
ser muito devoto. Podemos recordar que era decidido defensor da
perseguição aos hereges, mouros e judeus. Alguns historiadores espanhóis
chamam-lhe Apático. Os dois cognomes completam-se e definem a sua
personalidade.
No seu tempo foi publicada a terceira compilação de
leis portuguesas, feita por iniciativa de D. Filipe I, que vigorou
durante longo período e foi conhecida por Ordenações Filipinas.
Os inimigos da Espanha apoderaram-se de diversos
pontos que até então tinham estado nas mãos dos portugueses, na América
do Sul, na África e no Oriente, tendo-se perdido alguns e recuperado
outros pela força das armas. Podemos recordar as perdas sofridas em
Ceilão, na China e no Japão. No entanto, os corajosos e audazes
bandeirantes conseguiram empurrar para muito longe a linha definida no
Tratado de Tordesilhas, ocupando o Maranhão e aumentando enormemente a
superfície brasileira.
No seu tempo regista-se a publicação de diversos
trabalhos literários de grande importância, as obras de Duarte Nunes de
Leão, Francisco de Andrade, Fernão Mendes Pinto e outros.
Visitou Portugal no final do seu reinado, em 1619, e
quis assistir aqui a touradas e autos de fé. As nossas autoridades
sabiam que os apreciava e quiseram lisonjeá-lo! Mau gosto, tanto de um
lado como do outro!
Casou com D. Margarida da Áustria, também conhecida
por Margarida de Gratz ou Graetz, de quem nasceu o seu sucessor.
Governou Portugal e a Espanha desde 1598 até 1621.
D. FILIPE III — (GRANDE)
Em Portugal é vulgarmente chamado Grande,
tendo havido já quem lhe desse o nome de Opressor. Os
historiadores espanhóis costumam designá-lo por Alegre. Um
conhecido escritor da Espanha, André Manjón, afirmou dele que "quando
morreu andava a aprender a governar bem".
No seu reinado continuámos a perder diversas cidades,
portos e praças de guerra, em diversos pontos do globo. Alguns lugares
foram perdidos para sempre, embora outros tenham sido recuperados pela
força das armas, como aconteceu em Pernambuco, São Salvador e outras
localidades, no Brasil.
Em 1637 houve tumultos no Alentejo, contra a política
seguida pelo governo de Madrid. Pouco depois, em 1 de Dezembro de 1640,
efectuou-se o movimento restaurador da independência e Portugal passou a
ter rei próprio, D. João IV, neto da candidata ao trono em 1580, D.
Catarina de Bragança.
A revolta da Catalunha, que também lutava pela
independência, favoreceu indirectamente a posição portuguesa, pois
aliviou a pressão exercida contra o nosso País. Em boa parte, a conjura
do 1º de Dezembro foi feita também para que as nossas forças não fossem
combater os revoltosos catalães.
Diversos países europeus andavam então em luta aberta
contra a Espanha, a chamada Guerra dos Trinta Anos, e também isso
nos beneficiou em larga escala.
D. Filipe III (IV da Espanha) casou com D. Isabel de
Bourbon, filha do rei da França. Depois de viúvo, não sendo já rei de
Portugal, casou em segundas núpcias com D. Maria Ana da Áustria, a mãe
do seu sucessor, que já não foi nossa rainha.
Foi rei de Portugal desde 1621 a 1640.
Foi rei da Espanha desde 1621 a 1665.
TERCEIRA DINASTIA
SUAS CARACTERÍSTICAS
Descontentamento provocado pelo novo sistema de
governo e a saída de Lisboa para Madrid, do centro de decisões.
Saudosismo do passado, francamente progressivo e
atribuição das causas de decadência à realidade de momento.
Sonho esperançoso da recuperação da glória nacional
pela restauração do antigo sistema administrativo.
Revolta perante atitudes de exagerado autoritarismo
em que todos as conveniências se encaminhavam para a Espanha.
Incentivo de insurreição e sublevação por motivo da
subordinação das forças nacionais aos projectos ibéricos.
Revigoramento da vitalidade portuguesa pela emulação
dos numerosos adversários que a Espanha contava na Europa.
Reacção contra a política de aniquilamento praticada
pelos principais responsáveis da governação.
QUARTA DINASTIA
DA CASA DE BRAGANÇA
D. JOÃO IV — (RESTAURADOR)
Subiu ao trono de Portugal em resultado da Revolução
do dia 1º de Dezembro de 1640. As condições que a Espanha enfrentava, no
cenário europeu, permitiram que a guerra não fosse muito violenta, pois
no tempo deste rei houve apenas uma batalha de certa importância, a que
se travou na região de Montijo, em território espanhol, sinal de que
foram os portugueses os invasores. Foi-lhe dado o epíteto de
Restaurador por ser ele o monarca que deu realidade à recuperação da
vida nacional.
Embora todo o País quisesse a separação da Espanha,
houve ainda algumas manifestações de revolta, de que se destacou a do
marquês de Vila Real e do duque de Caminha, seu filho, que foram
executados.
Continuaram os ataques dos inimigos da Espanha a
diversas cidades do Ultramar, nomeadamente Angola e Brasil,
obrigando-nos a fazer grande esforço para conservar umas e recuperar
outras. Houve-as que se perderam, como aconteceu a Malaca e como antes
ocorrera com Ormuz e outras praças de guerra. Podemos recordar que, em
1641, os holandeses ocuparam Luanda, Benguela e São Tomé, que
recuperámos meia dúzia de anos mais tarde, em 1648.
D. João IV era neto de D. Catarina, Duquesa de
Bragança, e filho de D. Teodósio, Duque de Bragança. Casou em Espanha
com D. Luísa Francisca de Gusmão, filha do Duque de Medina Sidónia. Esta
senhora mostrou ser muito corajosa, apoiando o marido e incentivando-o a
que aceitasse a coroa. Diz-se desta senhora que em sua opinião "valia
mais ser rainha uma hora do que duquesa toda a vida" ou então que
"era preferível morrer reinando do que viver servindo".
Uma das suas medidas mais famosas foi proclamar Nossa
Senhora da Conceição (Imaculada Conceição) padroeira de Portugal. D.
João IV governou o País desde 1640 a 1656.
D. AFONSO VI — (VITORIOSO)
Foi rei de Portugal devido ao falecimento prematuro
de seu irmão D. Teodósio, legítimo herdeiro do trono. Era notoriamente
diminuído, sofrendo de grave deficiência física e mental, verdadeiro
mentecapto, por isso se admite ser um "rei espúrio". Durante a
menoridade governou como regente do reino sua mãe D. Luísa de Gusmão;
depois, exerceu o poder, com eficiência mas com exagerado autoritarismo,
o primeiro-ministro e escrivão de puridade, Conde de Castelo Melhor.
Duas anotações salientes enchem o seu reinado. A
primeira refere-se às vitórias que o exército português obteve contra as
tropas espanholas. Realmente, ganhámos as batalhas de Elvas, Ameixial,
Castelo Rodrigo e Montes Claros, o que consolidou a independência de
Portugal. Isso explica que este rei seja conhecido como Vitorioso.
A Guerra da Restauração terminou com o tratado de paz assinado em 1668.
A segunda anotação relaciona-se com o seu casamento e
o processo de nulidade subsequente. Os especialistas em direito canónico
sustentam que as condições do rei não lhe permitiam fazer casamento
válido; a anulação fundamentou-se em que nunca chegou a ser consumado.
Levaram-no a fazer casamento político!
A sua esposa foi D. Maria Francisca Isabel de Sabóia,
da alta nobreza da França, filha do Duque de Nemours. Em face do
desencanto apresentado por D. Afonso, D. Maria Francisca prendeu-se logo
aos atractivos do irmão, D. Pedro, futuro rei.
Um golpe de Estado afastou D. Afonso VI, que viveu
ainda longos anos como prisioneiro em alguns palácios, arredou do País o
Conde de Castelo Melhor e entregou o poder a D. Pedro. Logo que foi
declarada a nulidade matrimonial, este fez imediatamente o seu casamento
com D. Maria Francisca Isabel de Sabóia.
O reinado de D. Afonso VI estende-se desde a data do
falecimento de seu pai, em 1656, até ao ano da sua morte, em 1683. No
entanto, o governo pessoal não chegou a existir e o governo nominal vai
até 1667.
D. PEDRO II — (PACÍFICO)
Foi-lhe dado o epíteto de Pacífico pelo
simples facto de ser ele a assinar a paz com a Espanha.
Poderia contestar-se a validade do cognome, pois logo
a seguir, e na aparência desnecessariamente, entrou noutro conflito, a
Guerra da Sucessão da Espanha.
Fez ainda outro famoso convénio, este comercial, com
a Grã-Bretanha, o Tratado de Methwen. É apontado como grandemente
favorável à divulgação do vinho do Porto e altamente prejudicial à
incipiente indústria nacional.
Neste período foram encontradas as grandes reservas
de ouro, diamantes e esmeraldas, no Brasil, o que veio criar condições
económicas favoráveis e enriquecer artisticamente o País, com o que se
chama Estilo Barroco, de que temos inúmeros espécimes em igrejas
e palácios.
Foi no tempo de D. Pedro II que se reuniram pela
última vez as cortes, à maneira antiga, que aliás não chegaram ao fim
dos seus trabalhos por o rei as dissolver, sob a acusação de que
pretendiam deliberar em assuntos que não eram da sua competência.
A próxima reunião dos representantes do povo só veio a ocorrer já no
período do liberalismo. Diz-se que o absolutismo régio em Portugal veio
de D. Pedro II, mas em verdade tinha começado muito antes, pelo menos em
D. João II.
Depois do falecimento de D. Maria Francisca Isabel de
Sabóia, o rei contraiu segundas núpcias com D. Maria Sofia Isabel de
Neuburgo, filha do conde do Reno, o "Eleitor Palatino", de quem nasceu o
sucessor do trono.
D. Pedro II governou Portugal desde 1667 e foi rei de
1683 a 1706, data da sua morte. Em boa lógica o seu reinado deveria ter
começado logo em 1656, quando faleceu seu pai, D. João IV, evitando
assim mais uma sucessão régia anormal e um processo de casamento um
tanto escabroso.
D. JOÃO V — (MAGNÂNIMO)
Os reinados de D. Manuel I e de D. João V foram os
mais brilhantes da História de Portugal. Tiveram para isso motivos muito
semelhantes. D. Manuel I dispôs das volumosas riquezas que o erário
régio auferia do comércio das especiarias, sobretudo com a Índia, e D.
João V desfrutou os recursos provenientes da exploração aurífera, no
Brasil.
O primeiro relacionou o seu nome com uma gloriosa
manifestação artística, o Estilo Manuelino, e o segundo criou
condições para que se radicasse e desenvolvesse o que chamamos Estilo
Barroco Joanino.
Quanto a realizações estéticas ou utilitárias,
devemos salientar a construção do imponente Convento de Mafra e
do Aqueduto das Águas Livres, este para abastecer de água
potável a capital portuguesa. Poderíamos referir ainda a construção da
Torre dos Clérigos e respectiva igreja, no Porto, e do Palácio
Real de Queluz.
Interessou-se muito pelo desenvolvimento da cultura,
segundo os moldes do tempo. A organização mais célebre então formada foi
a Academia Real da História, que congregava pessoas de grande
cultura e de alto nível social. A actividade editorial nesse tempo
desenvolvida demonstra que havia entre as camadas sociais de maior
destaque verdadeiro interesse pelo problemas intelectuais, segundo os
moldes da época, como naquele tempo eram apreciados.
Negociou o fim da Guerra da Sucessão da Espanha, mas
logo a seguir tomou parte numa campanha contra os turcos, a pedido do
Papa Clemente XI, tornando-se famosa a batalha naval de Matapan, em que
participou a nossa marinha.
Descontando estas intervenções bélicas, o reinado de
D. João V corresponde a um dos mais prolongados períodos de paz de que
Portugal gozou ao longo de toda a sua História.
A reunião das cortes de que se falou em D. Pedro II
teve o objectivo principal de aceitarem este príncipe como sucessor
régio; segundo a jurisprudência da época, não sendo descendente directo
(a linha sucessória havia sido interrompida em D. Afonso VI)
precisava de que as cortes o aceitassem como herdeiro do trono
(Encontramos situação idêntica em D. Dinis e D. Carlos).
O cognome pelo qual ficou sendo conhecido,
Magnânimo, veio-lhe da sua obsessão pelas grandezas e pelas
honrarias.
Era muito cioso das prerrogativas régias, pretendia
ser tratado com tanta deferência como qualquer outro monarca.
Fez com que o prelado de Lisboa fosse sempre cardeal
e o núncio apostólico em Portugal elevado ao cardinalato antes de
terminar as suas funções; não sendo uma vez atendido nisso pelo Papa,
chegou a cortar relações diplomáticas com a Santa Sé.
Pensou ainda em que houvesse em Lisboa dois
antístites titulares, sendo um cardeal e o outro arcebispo.
Conseguiu que a catedral de Lisboa fosse elevada à
dignidade de sé patriarcal e que os seus cónegos usassem insígnias
semelhantes aos da corte papal.
Obteve para Portugal o privilégio de os sacerdotes
rezarem três missas no Dia de Finados, que só mais de século e meio
depois foi estendido a toda a Cristandade.
Para se poder equiparar aos monarcas espanhóis, que
eram chamados Católicos e ao da França, este denominado
Cristianíssimo, requereu e obteve do Papa Bento XIV o título e
tratamento de Fidelíssimo.
Casou com D. Maria Ana da Áustria, princesa da
família imperial, prova de que Portugal era então um reino altamente
prestigiado; foi uma rainha de grandes qualidades.
D. João V reinou durante o dilatado período
cronológico que vai de 1706 a 1750.
D. JOSÉ — (REFORMADOR)
O reinado de D. José confunde-se com o governo de
Sebastião José de Carvalho e Melo. Damos-lhe o cognome de Reformador
por se dizer que no seu tempo foram introduzidas profundas alterações na
forma de governar. Na realidade, não foram tantas nem tão radicais como
muitos julgam. A maior foi ter havido um primeiro-ministro que parece
substituir o rei, quando apenas houve uma quase perfeita sintonia e
harmonia de mentalidades entre o soberano e o governante efectivo.
Sebastião José (Marquês de Pombal) teve no
início da sua carreira o apoio da esposa de D. João V, que simpatizou
com sua mulher, por também ser como ela de nacionalidade
germano-austríaca.
Logo nos primeiros anos do reinado ocorreu o
terramoto de Lisboa (1-11-1755), que deu ao ministro o domínio da
máquina governativa. Tomou acertadas medidas de protecção aos
sinistrados e de inteligente reconstrução da capital.
Houve alguns anos depois uma tentativa de regicídio,
aproveitando o pretexto para abater a nobreza, tratando barbaramente os
acusados (por certo menos culpados do que o que deles se disse),
e combater injustamente os jesuítas (segundo o que outros países
europeus quiseram que se fizesse).
Os nobres implicados (Távoras) foram
executados com requintes selvagens. Os jesuítas foram expulsos tanto de
Portugal como das missões ultramarinas. A Universidade de Évora, mantida
pela Companhia de Jesus, foi encerrada, assim como todas as outras
escolas sustentadas pelos inacianos. Um deles, o missionário
italo-brasilíco P. Gabriel Malagrida, foi morto como herege num
repugnante e condenável auto de fé.
Fundou a Aula do Risco, para o estudo da
engenharia. Para melhor preparação da aristocracia nacional, para a
educação dos filhos da fidalguia, criou em Lisboa o Real Colégio dos
Nobres.
Reformou o esquema pedagógico da Universidade de
Coimbra, em moldes que se reconheceu serem pouco sensatos.
Instituiu em Lisboa a Junta do Comércio. Para
favorecer a produção e a comercialização do vinho do Porto, organizou a
Companhia-Geral da Agricultura das Vinhas do Alto-Douro.
Criou a Capitania-Geral de Moçambique. Estabeleceu o
Tribunal da Relação do Rio de Janeiro. Promoveu-se a colonização
de Angola com emigrantes europeus.
Organizaram-se grandes empresas comerciais
brasileiras, a Companhia do Grão-Pará e Maranhão e a Companhia de
Pernambuco e Paraíba, mas não deram os frutos que delas se esperavam.
Houve ainda outras, noutros lugares.
Os índios do Brasil foram declarados livres, sendo
proibida a sua redução à escravidão. Tomaram-se medidas tendentes a
dificultar o tráfico esclavagista e até a transferência de escravos,
pois adquiriam a liberdade os que entrassem no território de Portugal.
Também se decretou a extinção da distinção entre cristãos-velhos e
cristãos-novos (descendentes dos judeus).
Sob o aspecto bélico, podemos salientar que a
rejeição do Pacto de Família, aliança dos Bourbons contra a
Inglaterra (a nossa rainha D. Mariana Vitória era irmã do rei de
Espanha), nos arrastou para a guerra, sendo o País invadido pelas
tropas franco-espanholas, a "Guerra Fantástica". Localiza-se aqui a
famosa anedota de Pombal, quando disse ao embaixador da Espanha que
"para tirar um morto de sua casa são precisos quatro homens vivos".
Foi fundida com técnica de engenheiros nacionais
(em peça única e num só jacto), e solenemente inaugurada no Terreiro
do Paço, em Lisboa, a estátua equestre de D. José. Afirma-se ser a mais
perfeita estátua de bronze de Portugal e uma das melhores do mundo.
D. José casou com a já referida D. Mariana Vitória,
filha de D. Filipe V e irmã de D. Fernando VI e D. Carlos III, reis da
Espanha. Governou Portugal desde 1750 até 1777.
D. MARIA I — (PIEDOSA)
Se não considerarmos os diversos casos de regência do
reino, assim como o governo de D. Teresa, a rainha D. Maria I foi a
primeira senhora a governar Portugal. Aconteceu isso porque D. José teve
quatro filhas e nenhum filho varão.
Regista-se aqui um caso raro ocorrido em duplicado.
D. Maria I casou com seu tio D. Pedro III e sua irmã D. Maria Benedita
consorciou-se com o sobrinho D. José (que não sucedeu a esta rainha
por motivo de falecimento prematuro.
Logo que subiu ao trono, procurou emendar erros que
vinham do reinado anterior, dando liberdade a muitos presos, grande
parte jesuítas, injustamente encarcerados (o mais notável dos detidos
deverá ser o bispo de Coimbra, D. Miguel da Anunciação, encarcerado
durante mais de oito anos e que D. José ainda mandou soltar na véspera
da sua morte). Foi o que se chamou "Viradeira".
Neste reinado foi fundada a prestigiosa Academia
Real de Ciências de Lisboa, que congregava os maiores
intelectuais portugueses. Ao seu lado, podemos colocar a Academia
Real da Marinha, entidade destinada a promover a preparação e
a dar apoio aos que pretendiam seguir a carreira naval. Instituiu-se
também a Casa Pia, para dar abrigo e promover a educação das
crianças desvalidas ou abandonadas, ao tempo muito numerosas
(recordemos que era frequente, mesmo habitual, encontrar "enjeitados").
Instituiu-se a Biblioteca Pública de Lisboa,
organismo que se transformou com o tempo e a evolução da sociedade no
que hoje designamos por Biblioteca Nacional.
Um grupo de capitalistas, com apoio oficial,
lançou-se à construção de Teatro de São Carlos, em Lisboa, e
outros tomaram a iniciativa de edificar o Teatro de São João, no
Porto. Tiveram estes nomes para homenagear os futuros monarcas, D.
Carlota Joaquina e D. João VI.
D. Maria I viveu num tempo calamitoso, de grandes
transformações, profundas e inesperadas. Acompanhou o desenrolar da
Revolução Francesa e as modificações que ela motivou. Também sofreu
desgostos familiares, a morte do marido e logo a seguir a do filho
primogénito. Sendo muito impressionável, talvez isso a tenha
influenciado, tendo perdido o uso da razão (realidade que a
acompanhou nos últimos vinte e cinco anos de vida; este transtorno
psíquico manifestou-se sobretudo depois da morte do seu primogénito, D.
José). Por tal motivo, o governo de Portugal passou a ser
desempenhado pelo outro filho e sucessor, com a designação de "Príncipe-Regente".
Encontramos por vezes escritores que menosprezam as
qualidades de D. Maria I, firmando-se na demência de que veio a sofrer.
Estudos mais serenos levam a pensar que era muito inteligente e sensata,
fisicamente até bastante bonita. Temos de aceitar a loucura,
mas não a idiotia — coisas bem diferentes!
A História chama-lhe Piedosa por ter sido
realmente muito devota (talvez até mais do que o conveniente, não
sendo dela toda a culpa, integrava-se na mentalidade da época). Deu
prova de religiosidade fazendo construir a Basílica da Estrela, dedicada
ao Coração de Jesus, devoção no tempo em expansão.
A última fase do seu reinado acumulou acontecimentos
bélicos e políticos muito lastimáveis.
Exactamente no período em que se manifestou mais
acentuadamente a doença da rainha, ocorreu na região de Minas Gerais, no
Brasil, o movimento conhecido na História por "Inconfidência Mineira"
(que tinha em vista a proclamação da independência do país ou pelo
menos a da região aurífera). Como consequência disso, um dos
implicados, José Joaquim da Silva Xavier, por alcunha o "Tiradentes",
foi executado e os demais condenados a pena de degredo nas possessões
africanas, Angola e Moçambique. (Afirmam alguns estudiosos que havia
a intenção de que todos fossem degredados e que só a pouca habilidade {e
teimosia} do Tiradentes o levou ao cadafalso).
Enfrentámos a "Campanha do Roussilhão", logo
seguida pela "Guerra das Laranjas", e pouco depois pela
"Guerra Peninsular", que costumamos designar por Invasões
Francesas.
A corte decidiu deslocar-se para o Brasil, fixando-se
no Rio de Janeiro (e isso prende-se de perto com a futura e bastante
próxima proclamação da independência brasileira).
A primeira invasão francesa foi comandado por Junot;
ocupou Lisboa em Novembro de 1807, e ficou a governar Portugal em nome
de Napoleão Bonaparte, imperador dos franceses.
A segunda invasão atingiu o Porto, em 29 de Março de
1809, e ocorreu então o grande "desastre da ponte das barcas"
(a passagem do Douro fazia-se por um passadiço de madeira sobre
barcaças, que quebrou; e a multidão, empurrando-se para fugir aos
franceses, atirou ao rio milhares de pessoas).
A terceira invasão entrou pela Guarda, dirigindo-se a
Lisboa por Coimbra; travou-se a "batalha do Buçaco", em fins de
Setembro de 1810, derrotando os franceses, que prosseguiram até Torres
Vedras, mas não atingiram a capital.
Como a corte estava no Brasil, o governo de Portugal
foi confiado a um Conselho de Regência (em que os oficiais ingleses
tinham a supremacia, e isso causou enorme descontentamento, que se
traduziu em diversas atitudes e provocou várias reacções, em regra
contrárias à influência exercida pelos militares britânicos).
D. Maria I governou o País desde 1777 a 1792; de 1792
a 1816, data da sua morte, ocorrida no Rio de Janeiro, governou seu
filho D. João.
D. JOÃO VI — (CLEMENTE)
Iniciaremos estes apontamentos dizendo que o epíteto
dado a este rei teve como motivo a facto de ele, habitualmente, comutar
a pena de morte a todos os condenados que a solicitaram. Há estudiosos
que afirmam nunca ter negado a concessão desta graça.
No entanto, pode registar-se que em Lisboa houve em
1817 uma conspiração que terminou pela discutível execução do general
Gomes Freire de Andrade e de mais alguns revoltosos (os historiadores
ainda hoje dão informações divergentes sobre este acontecimento).
O reinado de D. João VI não ficou marcado por
realizações materiais de grande vulto. A ocorrência mais destacada
talvez seja o seu retorno a Lisboa, depois de quase uma dúzia de anos de
permanência no Brasil. Isso permitiu que a administração portuguesa
voltasse a uma certa normalidade.
Em 1820, eclodiu uma revolta popular no Porto que
teve como consequência quase imediata a instauração do sistema liberal e
pouco depois do regime constitucional, a partir de 1822.
Ainda no seu tempo, o seu filho primogénito D. Pedro
proclamou a independência brasileira, de que ficou a ser o chefe com o
pomposo título de "imperador" (veio a ser reconhecida por Portugal em
1825, ainda durante a vida de D. João VI, que reservou para si a
dignidade imperial — atitude simbólica, sem efeitos práticos nem
determinantes políticos destacados).
Já dissemos que contraiu matrimónio com D. Carlota
Joaquina, filha de D. Carlos IV e irmã de D. Fernando VII, de Espanha
(esta rainha prendia-se muito à actividade política e a sua acção teve
repercussões bastante importantes).
Tendo começado a governar em 1792, como regente do
reino, em 1799 passou a fazê-lo em seu nome, como "príncipe-regente";
de 1816 a 1826, ocupou o trono como rei de Portugal.
D. PEDRO IV — (LIBERALISTA)
Quando faleceu o rei D. João VI, em Março de 1826,
este príncipe ocupava o trono do Brasil (pelo que não podia ser rei
de Portugal, impediam-no tanto as leis portuguesas como as brasileiras,
mas encontrou solução para o dilema, abdicando em sua filha D. Maria da
Glória; considerou que era portuguesa por ter nascido antes da
independência brasileira, sendo por tal motivo que não pôde abdicar no
filho varão D. Pedro). Determinou que seu irmão mais novo D. Miguel
ficasse a governar na qualidade de regente do reino (casaria no
momento oportuno com a pequena rainha, sua sobrinha, então com sete anos
de idade).
Logo a seguir encarregou uma comissão de juristas,
orientada por um inglês, de elaborar uma "Carta Constitucional"
destinada a Portugal, tendo executado a tarefa em curtas semanas
(Saliente-se que, apesar da sua origem espúria, se considera a mais
perfeita constituição portuguesa, a que mais tempo vigorou, mais de
oitenta anos).
Portugal ficou a ser governado durante algum tempo
por sua irmã, D. Isabel Maria, que na devida ocasião entregou o governo
ao príncipe D. Miguel.
Em Abril de 1831, tomou a decisão de abdicar o trono
brasileiro em seu filho D. Pedro, e veio à Europa combater D. Miguel, já
então alçado como rei de Portugal. Preparou um exército na Inglaterra,
concentrou-o nos Açores, desembarcou ao norte do Porto e deu início a
uma guerra civil que durou de Julho de 1832 a Maio de 1834, terminando
com a derrota de D. Miguel.
A mais importante decisão de D. Pedro, logo que
findou a guerra, foi a injusta expulsão das ordens religiosas, em boa
parte favoráveis a D. Miguel. Pouco tempo de vida teve, pois veio a
falecer, vitimado pela tuberculose, nos fins de Setembro desse mesmo
ano, no Palácio Real de Queluz. (Podemos dizer que foi um rei
especulativo, pois não chegou a governar, embora a sua influência no
País tenha sido grande).
D. MIGUEL I — (TRADICIONALISTA)
Ainda em vida de seu pai, D. João VI, e segundo
parece por instigação de sua mãe, D. Carlota Joaquina, tinha já tomado
atitudes anti-liberais, nos movimentos conhecidos pelos nomes de
Vilafrancada (Vila Franca de Xira) e Abrilada (Abril de
1824).
Tomou conta do governo de Portugal, como regente do
reino, por indicação de D. Pedro. Reuniu as cortes, segundo os antigos
moldes, e foi aclamado rei.
O seu governo caracterizou-se por ferozes medidas de
perseguição aos liberais, tendo cometido muitos desmandos, que de certo
modo lhe tiraram a legitimidade governativa.
Sustentou a guerra civil durante quase dois anos,
sofrendo algumas derrotas militares, pelo que se viu obrigado a assinar
a Convenção de Évora-Monte e a sair de Portugal, tendo passado o
resto da sua vida no exílio, o longo período de trinta e dois anos
(alguns estudiosos sustentam que, em face das leis, pertencia-lhe o
trono, todavia, a experiência de governo que teve ocasião de manifestar
tirou-lhe toda a legitimidade).
D. Miguel governou Portugal de 1827 a 1834.
Casou com D. Adelaide de Lowenstein Rosemberg,
estando já no exílio, pelo que esta senhora nunca foi rainha de
Portugal.
Salientemos, no entanto, que tendo sido extinta a
linha sucessória de D. Maria II, a quem a seguir nos vamos referir, a
pretensão ou candidatura ao trono de Portugal concentrou-se na sua
descendência, atendendo à ordenação seguinte:
D. Miguel I(até 1866)>D. Miguel II (1866-1927)>
D. Duarte Nuno (1927-1976)>D. Duarte Pio (desde
1976).
D. MARIA II — (EDUCADORA)
Nasceu no Rio de Janeiro em Abril de 1819, sendo
filha da imperatriz do Brasil, D. Maria Leopoldina da Áustria, primeira
esposa de D. Pedro; a segunda foi D. Amélia de Beauarnais.
Já vimos em que condições ascendeu ao trono de
Portugal, tendo sido a nossa segunda soberana reinante.
Todo o seu governo foi muito agitado por convulsões
políticas, guerras e revoluções.
A Carta Constitucional foi substituída durante curto
prazo por outra constituição. (Os partidos políticos, em regra três,
combatiam-se ferozmente; apesar de muitos dos seus responsáveis serem
pessoas respeitáveis, a actuação partidária denotava um primitivismo
detestável).
Os principais movimentos revolucionários foram a
Revolução de Setembro de 1836 (que aboliu a Carta Constitucional),
a Belenzada (a contrariar a anterior), a Revolta dos Marechais
(Saldanha e Terceira, em favor da Carta), a Revolta de Costa Cabral
(restaurando-a) e finalmente a Regeneração (revolta do
marechal Saldanha), em 1851, que pôs fim a tão triste série.
As incidências bélicas mais salientes foram a
Revolução Popular da Maria da Fonte (por terem sido proibidos os
enterramentos nas igrejas) e a Revolta da Patuleia (devido a uma
mudança de governantes) que na prática estão em estreita sequência,
em 1846 e 1847, tendo terminado pela intervenção estrangeira com a
Convenção de Gramido.
D. Maria II tornou o ensino primário obrigatório e
gratuito, criou os liceus distritais, fundou a Escola
Médico-Cirúrgica e a Escola Politécnica (uma de cada
designação em Lisboa e no Porto) e ainda o Conservatório Nacional
de Música, Dança e Teatro, em Lisboa.
Construiu-se na capital a importante casa de
espectáculos conhecida pelo seu nome, o Teatro Nacional de D. Maria
II.
Foi-lhe atribuído muito justamente o cognome de
"Educadora", pois o mereceu por dois motivos diferentes, por todos
reconhecidos:
— pelo grande cuidado posto na educação moral e
instrução intelectual dos seus filhos;
— pelo interesse que dedicou ao projecto da elevação
do nível cultural do seu povo, com particular incidência sobre a
infância e juventude.
O nome desta senhora leva-nos a salientar pormenores
curiosos da sua vida.
Foi elevada ao trono com sete anos e com essa idade
perdeu sua mãe.
Com quinze anos iniciou o seu governo, no final da
guerra. Contraiu o seu primeiro consórcio com D. Augusto de Leuchtemberg
(irmão da sua madrasta, e dele ficou viúva antes de fazer dezasseis
anos, exactamente no dia em que se completavam dois meses de vida
matrimonial).
Poucos dias depois de completar dezassete anos,
consorciou-se com o rei D. Fernando II (D. Fernando
Saxe-Coburgo-Gotha), e dele teve numerosos filhos, em outros
dezassete anos de casada.
Faleceu com trinta e quatro anos de vida. Veio ao
mundo em 1819 e expirou em 1853.
Pode, pois, dizer-se que teve vinte e sete anos de
reinado (1826-1853) mas apenas dezanove anos de governo (1834-1853).
D. PEDRO V — (ESPERANÇOSO)
Foi o soberano português que congregou em torno do
seu nome maiores simpatias, sendo por todos reconhecidas as suas
inegáveis qualidades e invulgares virtudes.
Teve um reinado de curta duração, de certo modo
semelhante ao de D. Duarte. Alimentava na população portuguesa muitas
expectativas de que ele viesse a ser um monarca excepcional, pelo que
foi ainda em vida chamado Esperançoso.
No seu tempo inaugurou-se o primeiro troço de caminho
de ferro, de Lisboa à estação de Carregado (na distância de trinta e
seis quilómetros, preparando a ligação com o Porto e mais tarde com
outras cidades de Portugal e da Espanha).
Também foi no seu reinado que se estabeleceu a
primeira carreira regular de vapores entre os portos de Portugal e os de
Angola, preponderantemente entre Lisboa e Luanda.
Estando muito interessado, desde havia vários anos,
na campanha de repressão ao tráfico esclavagista, Portugal sofreu grande
afronta do governo francês, que devia apoiá-la. (Tendo sido apanhado
pelas nossas autoridades de Moçambique o barco negreiro "Charles et
George", pertencente a uma empresa da França, foi aprisionado,
segundo estava decidido. O governo deste país colocou-se abertamente ao
lado dos esclavagistas, exigiu a libertação do navio e o pagamento de
elevada indemnização).
Ainda em relação com a África, e mais concretamente
com Angola, foram realizadas diversas expedições científicas, de que
podemos destacar as de Silva Porto, Frederico Welwitsch. Ladislau Magyar
e outros.
Para dar incremento e maior expansão à economia
nacional, organizaram-se algumas amostras públicas, tornando-se famosa a
Exposição Industrial do Porto.
Enriqueceu os estudos de nível universitário com a
criação do Curso Superior de Letras (corrigindo neste pormenor
um erro da reforma pombalina).
Para o seu funcionamento atribuiu-lhe volumosa verba
tirada do seu "fundo civil".
Estabeleceu um curso e um conjunto de disciplinas que
lembram uma Faculdade de Filosofia e História.
O rei era muito culto, em consequência da primorosa
educação recebida e dedicava-se a escrever. (Os seus trabalhos
literários foram publicados pela Academia de Ciências de Lisboa, entre
1923 e 1930, constituindo cinco volumes).
Portugal foi atingido por duas temerosas epidemias, a
cólera-morbo e a febre amarela, que causaram milhares de vítimas (o
monarca deu prova de grande coragem e alto espírito humanitário na
visita aos hospitais e no auxílio aos carecidos).
Embora por outras enfermidades, a família régia foi
também dizimada (chegando a espalhar-se o boato de ter havido actos
criminosos, inclusive o envenenamento, que estudos sérios vieram a
negar; sabemos que o rei e seus irmãos foram contagiados pelas águas de
Vila Viçosa, que fizeram ainda outras vítimas). Podemos enumerar
aqui a negra lista dos falecimentos dos principais membros da família
real:
— Em 17 de Julho de 1859, a rainha D. Estefânia, de
uma angina;
— Em 06 de Novembro de 1861, o infante D. Fernando,
de tifo;
— Em 11 de Novembro de 1861, o rei D. Pedro V, também
de tifo;
— Em 27 de Dezembro de 1861, o infante D. João, de
igual ataque.
D. Pedro V contraiu matrimónio em 18 de Maio de 1858,
com a princesa D. Estefânia de Hohenzollern-Sigmaringen, senhora dotada
com qualidades raras; os dois cônjuges amavam-se apaixonadamente
(caso muitíssimo raro em famílias reais), tendo feito vida conjugal
durante o curto período de catorze meses.
Nasceu em 16 de Setembro de 1837. Subiu ao trono com
dezasseis anos, em 1853. Casou com vinte, completos, mas estava já viúvo
aos vinte e dois anos. Faleceu aos vinte e quatro e, consequentemente,
teve oito anos de reinado.
D. LUÍS — (POPULAR)
Este rei recebeu trono devido a seu irmão D. Pedro V
ter falecido sem deixar descendência (ao princípio encontrou ambiente
desfavorável, por motivo da estupefacção causada pelo falecimento
próximo dos seus três irmãos, mas depois veio a conquistar as simpatias
da população, que reconheceu as suas grandes qualidades).
Era mais intelectual do que político. Fez primorosa
tradução e rica edição de boa parte da obra de Shakespeare
(manifestava assim os frutos da esmerada educação que recebera, mais
erudita de que política, pois não se podia prever que alguma vez viesse
a reinar; no seu tempo esteve em projecto de organização um agrupamento
político, que se pensava denominar "Vida Nova", formado por
intelectuais célebres, mas não chegou a constituir-se; reuniam-se
frequentemente em jantares e tertúlias; como o projecto se frustrou,
reconhecendo-se o fracasso da iniciativa, o grupo passou a ser conhecido
por "Vencidos da Vida", nome que eles próprios lhe atribuíram;
praticamente pertenciam todos à "Geração de 70"; D. Luís
viveu um período de certo brilho literário — Júlio Dinis, João de Deus,
Camilo e Eça — e artístico — Soares dos Reis, Teixeira Lopes, Malhoa,
Columbano, Estação do Rossio e Palácio do Buçaco, estilo neogótico).
Os antigos partidos políticos foram remodelados;
apareceram até dois agrupamentos inclinados à dissidência, o Partido
Socialista e o Partido Republicano. Quanto aos outros, de
ideologia monárquica, entrou-se na fase conhecida por rotativismo,
sucedendo-se no governo o Partido Histórico e o Partido
Regenerador.
Durante o reinado de D. Luís, foi publicado o
primeiro Código Civil Português. Dilatou-se a rede ferroviária
nacional. Aboliu-se definitivamente a pena de morte e a escravatura.
Foi, no entanto, na África que mais se fez sentir a
vitalidade nacional. Efectuou-se a notável Conferência de Berlim,
considerada o marco da verdadeira História da África, em sentido moderno
e actual.
Promoveram-se muitas e frutuosas expedições
científicas (Serpa Pinto, Brito Capelo, Roberto Ivens, Henrique de
Carvalho), fundaram-se cidades novas, consolidou-se o domínio português.
Fizeram-se tratados em que foram estabelecidas novas
fronteiras africanas (tornando-se famoso o "mapa-cor-de-rosa",
que previa a união territorial de Angola com Moçambique; contudo, o
grande interesse manifestado colidiu com as ambições estrangeiras,
nomeadamente da Grã-Bretanha, e Portugal sofreu a enorme afronta de ter
de aceitar o "ultimato inglês"; o nosso Hino Nacional evoca esse
acontecimento).
D. Luís casou com uma princesa italiana, D. Maria Pia
de Sabóia (filha de Vítor Manuel, rei do Piemonte e unificador da
Itália, senhora de grandes qualidades, extremamente generosa, que se
apresentava sempre que surgissem calamidades ou catástrofes, onde
pudesse exercer a caridade).
Tendo sido elevado ao trono em 1861, veio a falecer
em 1889, portanto com vinte e oito anos de reinado. Recebeu o cognome de
Popular pela simplicidade com que se apresentava, havendo autores
que lhe deram o epíteto de Bom, porque realmente o era.
D. CARLOS I — (MARTIRIZADO)
Iniciou o seu governo com a agitação causada pelo
"ultimato inglês de 1890", que veio causar ou pelo menos agravar a
crise política, económica e social.
Apesar disso, prosseguimos em África, Angola e
Moçambique, a tarefa da consolidação da soberania portuguesa
(pacificação das insurreições, desenvolvimento de diversas campanhas e
cuidando de criar condições de progresso).
Manifestou-se a acção de diversos estudiosos em
diferentes sectores, contando-se cientistas famosos e eruditos
abalizados (continuou a efectuar-se o estudo sistematizado da fauna e
flora dos territórios ultramarinos, com resultados surpreendentes e
extremamente valiosos).
Desenvolveu-se a indústria nacional (instalando
diversas actividades, destacando-se algumas fábricas de cimento e afins,
incentivando a cerâmica tradicional e dando-lhe aspecto mais primoroso,
podendo destacar-se o que Bordalo Pinheiro fez em Caldas da Rainha,
criando fama e nome ainda perdurável).
D. Carlos era um artista e um cientista (mais
artista e cientista do que político, em que também foi individualidade
notável).
Desenvolveu intensa pesquisa oceanográfica
(actuando como verdadeiro sábio, encontrou três espécies novas para as
costas de Portugal e uma nova para a História Natural, que recebeu o seu
nome — Odontaspis Nasutus Bragança n.sp; a sua colecção
ictiológica, que primeiro esteve no Palácio das Necessidades, foi depois
integrada no acervo do Museu da Marinha).
Foi pintor de mérito (tendo tomado parte em
importantes exposições de arte, produzindo trabalhos de grande valor
expressivo).
Interessava-se também pela exploração agrícola (de
forma moderna e rentável, conseguindo que as suas terras produzissem em
valores económicos apreciáveis).
Era bom desportista (nas modalidades então mais em
voga na alta sociedade, no ténis, no golfe, nos desportos náuticos, e
também mostrou ser grande apaixonado pela actividade venatória, a caça).
Na política interna, teve de sofrer os ataques dos
partidos que combatiam o regime, os que defendiam a proclamação
republicana (registou-se no Porto, em 31 de Dezembro de 1891,
portanto logo no início do reinado, a primeira grande manifestação
republicana, uma intentona para destruir a Monarquia, mas talvez mais o
desprestigiassem, com o seu comportamento duvidoso, os monárquicos
desonestos do que os republicanos dignos).
D. Carlos contraiu núpcias, em 1886, com D. Amélia de
Orleães, cujo nome completo era Maria Amélia Luísa Helena (foi a
nossa última rainha; faleceu na sua pátria de origem, a França, por
motivo do exílio de Portugal, em 1951).
No dia 1 de Fevereiro de 1908, quando a família real
regressava de Vila Viçosa, foi vítima de criminoso atentado, tendo sido
morto pelas balas de um facínora e com ele o príncipe real D. Luís
Filipe, que então contava vinte anos de idade, praticamente o tempo de
duração do seu reinado.
A tragédia que lhe causou a morte proporcionou que
lhe chamassem "Mártir", ou "Martirizado" e também por
vezes "Desventurado".
(Repetiu-se com D. Carlos o que acontecera com D.
Dinis e com D. João V — sucedeu a seu pai mas o penúltimo rei era seu
tio. Só que neste caso não houve impedimento da sucessão).
Tendo nascido em 1863, casou em 1886, foi aclamado
rei em 1889, e morreu em 1908.
D. MANUEL II — (EXILADO)
(O rei D. Manuel II, o último monarca da dinastia
brigantina, e D. Henrique, o último soberano da dinastia de Avis,
tiveram praticamente igual tempo de governo e foram os mais curtos da
Monarquia Portuguesa. D. Manuel reinou menos de três anos e o
Cardeal-Rei menos de dois anos).
Pode dizer-se que nada há a registar no reinado de D.
Manuel II (a não ser que se diga que houve em todo ele intensa
actividade da propaganda republicana, chegando a abusos inaceitáveis,
como a ostensiva glorificação do regicida).
Mostrou ser um príncipe magnânimo, disposto a
perdoar. Pretendia criar clima de entendimento e tranquilidade, mas os
adversários políticos não quiseram colaborar com tais intenções.
No dia 4 de Outubro de 1910, eclodiu em Lisboa uma
sublevação que ao princípio mostrou fracassar. Mas o apoio dado pelos
populares inverteu a situação e no dia seguinte, 5 de Outubro, foi
proclamada a República Portuguesa.
O rei D. Manuel e a família real — incluindo as duas
rainhas viúvas, D. Maria Pia (já muito idosa e com deficiências
mentais, que foi para a Itália, a sua pátria, onde faleceu exactamente
nove meses depois) e D. Amélia de Orleães, assim como seu tio o
infante D. Afonso Henriques — deixaram Portugal, a caminho do exílio.
Apesar do que aconteceu, pode afirmar-se que era
grande a popularidade do rei D. Manuel II, claramente demonstrada na sua
visita ao Porto em Novembro de 1908, e nas comemorações do centenário da
batalha do Buçaco, em Setembro de 1910, oito dias antes da sua saída do
País e fim do seu reinado.
Em 1913, fez o seu casamento com D. Augusta Vitória
de Hohenzollern-Bragança (como ele bisneta de D. Maria II), que
não chegou a ser por tal motivo rainha de Portugal.
Durante a Grande Guerra, prestou auxílio humanitário
aos que dele careciam, apoiando os serviços mantidos pela Cruz Vermelha
Portuguesa.
Tendo fixado a residência na Inglaterra, ali faleceu,
em Twickeenham, no ano de 1932; havia nascido em 1889.
Enquanto infante de Portugal, usou o título de Duque
de Bragança (acontecera a mesma circunstância com o seu homónimo D.
Manuel I, que como ele subiu ao trono em consequência de uma morte
trágica).
À semelhança de seu pai e seu avô, interessava-se
muito pelos assuntos intelectuais, determinando que os seus haveres
fossem destinados, após a morte de sua mãe e de sua esposa, para a
manutenção de um organismo cultural, a Fundação da Casa de Bragança
(e tanto D. Amélia como D. Augusta Vitória voluntariamente
prescindiram de tais valores, antecipando a actividade programada).
Ainda dentro deste princípio, elaborou uma obra de
pesquisa de muito mérito, que foi editada em três volumes de cerca de
oitocentas páginas cada um (o primeiro impresso em 1929, o segundo em
1932, o terceiro em 1935, e reimpressos em fac-símile em 1995;
anteriormente havia publicado um catálogo sobre o mesmo tema e quase
igual denominação). Deu-lhe o extenso título de:
"LIVROS ANTIGOS PORTUGUESES"
1489-1600
da Biblioteca de Sua Majestade Fidelíssima
descritos por S. M. El-Rei D. Manuel II
QUARTA DINASTIA
SUAS CARACTERÍSTICAS
Iniciou-se com duas guerras seguidas, que absorveram
a maior parte da nossa capacidade de resistência.
Tivemos um período de euforia com a exploração das
riquezas auríferas do Brasil.
Registamos um período de exagerado autoritarismo, em
relação com a difusão do cesarismo e do despotismo iluminado.
Promoveu-se o aniquilamento da aristocracia, com a
execução dos fidalgos que se opusessem ao poder régio.
Tentou-se dominar o sector eclesiástico, combatendo
as ordens religiosas e difundindo o anticlericalismo.
Decisiva influência do enciclopedismo e da
mentalidade racionalista, espalhados pelos intelectuais e invasores
franceses.
Fez-se a experiência da valorização excessiva da
burguesia, sob o aspecto de luta pela liberdade política e religiosa.
A dinastia divide-se em duas partes distintas,
separadas por guerras, as invasões francesas e as lutas liberais.
Enfrentaram-se em luta de aniquilamento os
tradicionalistas para conservarem vantagens e os liberais para as
conquistarem.
Desenvolveu-se grande esforço para promover o
progresso e desenvolvimento do País, que as revoluções entravavam.
O nível cultural teve satisfatória elevação, podendo
registar-se muitos e prestigiosos nomes, em todos os ramos.
Em paralelo com o território do reino, procurou-se
também levar a civilização às populações das conquistas de além-mar.
A oposição política fez-se sem respeito pela
dignidade das pessoas, cometendo-se crimes graves, inclusive
assassinatos.
PERÍODO REPUBLICANO
PRESIDENTES DA REPÚBLICA
— JOAQUIM TEÓFILO FERNANDES BRAGA
interino (1910-1911)
— MANUEL DE ARRIAGA BRUM DA SILVEIRA
eleito, renunciou (1911-1915)
— JOAQUIM TEÓFILO FERNANDES BRAGA
interino (1915-1915)
— BERNARDINO LUÍS MACHADO GUIMARÃES
eleito, deposto (1915-1917)
— SIDÓNIO BERNARDINO CARDOSO DA SILVA PAIS
interino, assassinado(1917-1918)
— JOÃO DO CANTO E CASTRO DA SILVA PAIS
interino (1918-1919)
— ANTÓNIO JOSÉ DE ALMEIDA
eleito, cumpriu (1919-1923)
— MANUEL TEIXEIRA GOMES
eleito, renunciou (1923-1925)
— BERNARDINO LUÍS MACHADO GUIMARÃES
eleito, deposto (1925-1926)
— JOSÉ MENDES CABEÇADAS JÚNIOR
interino (1926-1926)
— MANUEL DE OLIVEIRA GOMES DA COSTA
interino (1926-1926)
— ANTÓNIO ÓSCAR FRAGOSO CARMONA
eleito,cumpriu(1926-1951)
— FRANCISCO HIGINO CRAVEIRO LOPES
eleito,cumpriu (1951-1958)
—AMÉRICO DEUS RODRIGUES TOMÁS
eleito, deposto (1958-1974)
— ANTÓNIO SEBASTIÃO RIBEIRO DE SPÍNOLA
interino (1974-1974)
— FRANCISCO DA COSTA GOMES
interino (1974-1976)
— ANTÓNIO DOS SANTOS RAMALHO EANES
eleito,cumpriu (1976-1986)
— MÁRIO ALBERTO NOBRE LOPES SOARES
eleito,cumpriu (1986-1996)
— JORGE FERNANDO BRANCO SAMPAIO
eleito, em exercício (1996- ......)
PRIMEIRA REPÚBLICA (DEMAGÓGICA)
O período preenchido pela Primeira República, de 1910
a 1926, deixou-nos entre outros os tópicos seguintes:
— Promulgação da Constituição Republicana Liberal;
— Lei da Separação do Estado e Igreja, com a
confiscação dos bens eclesiásticos;
— Diversas revoluções e contínuas mudanças de
governo;
— Incursão monárquica de Paiva Couceiro, organizada
na Espanha em 1912 e sua derrota em Chaves;
— Entrada de Portugal da Grande Guerra, combatendo ao
lado dos Aliados;
— Continuação das campanhas africanas de pacificação
do gentio sublevado;
— Assassinato de Sidónio Pais, na estação ferroviária
do Rossio, em Dezembro de 1918;
— Viagem aérea de Lisboa ao Rio de Janeiro, realizada
por Gago Coutinho e Sacadura Cabral em 1922;
— Participação nas comemorações do primeiro
centenário da independência do Brasil, no mesmo ano.
SEGUNDA REPÚBLICA (CORPORATIVA)
O período abrangido pela Segunda República, de 1926 a
1974, ficou assinalado por:
— Reforma do sistema administrativo tendo em vista a
consecução do equilíbrio orçamental;
— Promulgação da Constituição Republicana
Corporativa, aprovada por plebiscito em 1933;
— Oposição ao Comunismo, sobretudo a partir da Guerra
Civil de Espanha;
— Neutralidade actuante durante a Segunda Guerra
Mundial;
— Comemoração do Duplo Centenário da Independência e
da Restauração, em 1940 (Exposição do Mundo Português);
— Os presidentes Óscar Carmona, Craveiro Lopes e
Américo Tomás visitam os territórios do Ultramar;
— Sustentação da luta contra a independência dos
Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa.
TERCEIRA REPÚBLICA (DEMOCRÁTICA)
O período decorrido desde a instauração da terceira
República, iniciado em 1974, ficou marcado por:
— Independência estouvada dos territórios
ultramarinos;
— Favorecimento ostensivo dos movimentos comunistas;
— Abandono dos interesses dos cidadãos retornados;
— Desistência da defesa dos direitos dos goeses;
— Péssima negociação da autonomia de Timor;
— Entrega gratuita e incondicional de Macau à China;
— Melhoria estrutural das condições económicas do
País;
— Correcção das distonias sociais e carências
nacionais;
— Entrada de Portugal na União Europeia;
— Utilização claudicante dos recursos daí
provenientes;
— Promulgação da Constituição Política
(Democrática) da República Portuguesa.