Espingarda Castro
Guedes
Jaime Regalado
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Os primeiros ensaios, de que há
registo, efectuados com a espingarda do sistema
concebido pelo então Alferes de Caçadores
10, Luís Fausto de Castro Guedes Dias, tiveram
lugar no polígono de tiro de Vendas Novas,
nos finais de Julho de 1880 [1] e estenderam-se
até 1882.
Por fim, em Janeiro de 1883, por sugestão
do Comandante da Escola Prática de Engenharia
de Tancos, onde a grande maioria destes testes se
realizaram, o Alferes Castro Guedes solicitou à
Secretaria de Estado da Guerra permissão
para efectuar experiências em larga escala,
com esta arma de sua invenção. Para
a avaliação dos resultados, foi nomeada
uma comissão de escolha de armamento que,
em Fevereiro de 1883, redigiu um relatório
bastante favorável [2] .
Até aqui, os estudos e trabalhos do Alferes
Castro Guedes terão incidido, quase exclusivamente,
sobre o mecanismo de tiro e de obturação
da culatra e não sobre a arma como um todo,
já que, para as referidas experiências,
requereu que lhe fossem fornecidos "
dois canos Gras e pelo menos mil cartuchos completos
Gras". Mais ainda, os sucessivos pedidos de
reembolso das despesas efectuadas com a construção
e aperfeiçoamento desta arma, levam a crer
que os trabalhos decorreram em oficinas particulares,
às expensas do próprio Alferes Castro
Guedes.
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FIG. 1 - Tenente Luis Fausto de
Castro Guedes Dias e sua esposa D. Zephirina de
Castro Guedes Silva Sanches de Miranda, fotografia
tirada no Porto entre 1884 e 1890. |
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Em Junho de 1883, realizaram-se
novos ensaios, desta vez no polígono de tiro
de Vendas Novas, perante uma comissão nomeada
pelo Director Geral da Arma de Artilharia [3]. Na sequência
dos bons resultados obtidos e parecer favorável
desta comissão, foi ordenado o fabrico de 50
espingardas protótipo, de acordo com os desenhos
e indicações dadas pelo próprio
Alferes Castro Guedes. Os trabalhos de fabrico e aperfeiçoamento,
passaram a decorrer nas oficinas da Fábrica de
Armas do Arsenal do Exército (Santa Clara) estendendo-se
até Junho de 1884.
Logo que onze destas armas protótipo fossem dadas
por concluídas, uma delas seria oferecida a Sua
Majestade El-Rei D. Luiz I e as restantes 10 destinadas
a dar continuidade aos ensaios que ainda decorriam e
que se estenderam ao longo de 1884, entre os polígonos
de Tancos e Vendas Novas.
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Fig. 2 - Espingarda protótipo
sistema Guedes, com sabre baioneta, da qual foram
fabricadas 50 exemplares na Fábrica de Armas
do Arsenal do Exército em 1884. Um destes
exemplares foi oferecido a S. Majestade El-Rei D.
Luís I. |
Ainda no ano de 1883 houve
intenção de registar os privilégios
da invenção desta arma e do sistema de
segurança, em França, na Alemanha, em
Inglaterra, Bélgica, Estados Unidos da América,
Espanha e Portugal. Porém, ao que parece, a quantia
de "
um conto setecentos e trinta mil reis
"
nunca chegou a ser disponibilizada pela Fazenda Pública
para o efeito, pelo que a respectiva patente só
veio a ser registada em Portugal, em 1884.
A espingarda sistema Guedes é uma arma de tiro
simples, de carregamento pela culatra e fogo central,
para munições de cartucho metálico
e pólvora negra.
A obturação faz-se por deslizamento vertical
da culatra, accionada por uma alavanca exterior que
é simultaneamente o guarda-mato.
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Fig 3 - Pormenor da caixa de mecanismos
e bloco obturador da espingarda sistema Guedes,
modelo FA 1884. |
O bloco obturador é, por sua
vez, uma caixa prismática em aço, que
aloja no seu interior o cão-percutor e o mecanismo
de armar/desarmar.
a
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b
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c
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Fig. - 4.a, b, c Bloco
de obturação e alavanca de motriz
(guarda-mato) da espingarda Guedes modelo FA 1884.
No interior do bloco de obturação,
está alojado o mecanismo de armar/desarmar
( c ). Neste modelo, a alavanca motriz está
ligada ao mecanismo de armar/desarmar por um parafuso-eixo.
Na face esquerda do bloco obturador ( a ), é
visível o sulco-guia que rege os movimentos
do referido bloco.
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Na sequência
dos bons resultados obtidos com esta arma nos ensaios
efectuados, em Julho de 1884, a Secretaria de Estado
da Guerra, encarregou o alferes Castro Guedes Dias
de se deslocar a Steyr, na Áustria, a fim
de estudar a possibilidade do fabrico e melhoramento
desta arma de sua invenção [4], autorizando-o
a executar nesta fábrica 19 destas armas
em calibre 11 mm e uma em calibre 8 mm.
Na altura, a fábrica de armas de Steyr, dos
irmãos Werndl, era não só uma
das mais conceituadas e modernas da Europa, mas
também das mais prolíferas em termos
de patentes e inovações, pelo que
não poderia ser melhor a escolha deste local,
para o melhoramento e produção desta
espingarda.
As armas experimentais fabricadas na OEWG sofreram
diversas alterações em relação
aos protótipos fabricados no arsenal do Exército,
ao nível dos mecanismos e na caixa da culatra,
que em vez de latão passou a ser em aço.
Ao que parece estas modificações terão
sido rapidamente implementadas pois surgem já
representadas no diagrama anexo à patente
nº 929 de Julho de 1884, registada em Portugal.
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Fig. - 5 Representação
esquemática do mecanismo da culatra, sistema
Guedes, e da respectiva munição, na
obra de Luiz Mardel, de 1888, de acordo com o anexo
à patente nº 929 de Julho de 1884. |
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O regresso da Áustria
do Tenente Castro Guedes, em Dezembro de 1884, foi marcado
por uma curiosa situação, de que nos dá
conta um telegrama dirigido ao Ministro da Guerra. O
Tenente Castro Guedes ficou retido na fronteira em Handaya
durante nove dias por não ter permissão
para atravessar Espanha, acompanhado pelas 20 armas
que havia sido autorizado a fabricar em Steyr [5].
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Fig. 6
- Telegrama enviado pelo Tenente Castro Guedes,
da fronteira de Handaya, por não ter permissão
para atravessar Espanha com as armas construídas
em Steyr. |
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