Generalização do uso militar do cano estriado: sistema
Delvigne-Minié
O grande obstáculo ao emprego militar generalizado das
armas de cano estriado, mais do que o seu elevado custo,
foi a dificuldade e morosidade do seu carregamento, que
exigiam do soldado alguma perícia e alguns cuidados
adicionais.
Enquanto nas espingardas de alma lisa existe uma
diferença entre o diâmetro do projéctil e o diâmetro
interno do cano, diferença esta designada por vento, de
modo a que a acumulação da fuligem, resultante da
combustão da pólvora, não impeça o carregamento; nas
armas de cano estriado, o projéctil tem que entrar justo
às estrias, para que estas lhe imprimam o efeito de
rotação. Se a bala estiver demasiado justa, a pressão
usada para forçar o projéctil ao longo do cano durante o
carregamento, vai deformá-lo, tornando a sua trajectória
instável. Se o projéctil estiver demasiado folgado, após
o disparo, este vai percorrer as estrias, sem adquirir o
movimento de rotação.
Na verdade, esta situação só viria a ser definitivamente
ultrapassada com a introdução dos sistemas de
carregamento pela culatra. Até então, diversos sistemas,
mais ou menos engenhosos, foram surgindo no sentido de
facilitar o carregamento das armas de cano estriado, sem
que se perdesse o efeito das estrias.
Neste contexto, em 1835, W. Greener introduziu o
conceito de bala expansiva. A bala consistia num
projéctil oval, com um diâmetro e meio de comprimento,
em que uma das calotes era constituída por uma peça de
“metal” fundido, que se inseria num orifício da base
plana do projéctil.
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Fig. 4 Bala
expansiva concebida por W. Greener. O taco de
metal é inserido no orifício da base plana do
projéctil e, por acção da pressão dos gases da
combustão da pólvora, durante o disparo, produz
o alargamento do projéctil contra as estrias. |
No
carregamento, a bala era inserida pelo cano com a base
de metal fundido orientada para a culatra, descendo
livremente até ficar pousada sobre a carga de pólvora.
Pela pressão dos gases da explosão da pólvora no
disparo, a base de metal fundido, com forma ligeiramente
tronco-cónica, é forçada a entrar no orifício da base do
projéctil, alargando-o contra as paredes do cano e
consequentemente, ajustando-o às estrias.
Em 1842, o
Capitão francês Gustave Delvigne, patenteou um sistema
de bala ogival que, pelo seu diâmetro, entrava
livremente pela boca do cano estriado até assentar sobre
a carga propulsora. Uma cavidade na base deste
projéctil, permitia não só deslocar o seu centro de
massa para a parte anterior, conferindo-lhe maior
estabilidade na trajectória mas, sobretudo, que os gases
resultantes da explosão da carga propulsora, actuassem
sobre essa cavidade, de modo a expandir a parte
posterior do projéctil, ajustando-o às estrias e
forçando-o a descrever o movimento de rotação imposto
por estas.
Dois anos
mais tarde, em França, em 1844, o capitão Claude-Étienne
Minié, explorou de modo ligeiramente diferente a ideia
de Delvigne. Em vez dos gases da explosão da carga
propulsora actuarem directamente sobre a base do
projéctil, Minié introduziu uma pequena cápsula
cilindrica, em ferro, na cavidade tronco-cónica da base
do projéctil que, quando actuada pelos gases da explosão
da carga propulsora, avança dentro desta cavidade e
força o alargamento da base do projéctil, ajustando-o às
estrias.
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Fig. 5 Representação da bala Minié, onde se pode
ver a cápsula de ferro inserida na cavidade, na
base do projéctil. In História da Arma de
Fogo Portátil de Luiz Mardel, Lisboa 1885
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Decorreriam
ainda cerca de cinco anos de ensaios e melhoramentos,
tanto no projéctil como nos canos que os utilizavam, até
que em Inglaterra, em 1849, foram formalmente abertos os
estudos, no sentido de criar a nova arma padrão para a
Infantaria, em percusão, com cano estriado e de
carregamento pela boca, tendo em 1851 sido
definitivamente adoptado o sistema Delvigne-Minié.
Embora Minié
tenha reconhecido publicamente a importância que
Delvigne deteve em todo este processo e em Abril de
1855, estes dois inventores terem efectuado uma
declaração pública, onde ambos partilhavam a opinião de
que esta nova espingarda se devia designar
Delvigne-Minié [24], a verdade é que esta nomenclatura
correcta nunca foi adoptada, sendo estas armas
geralmente designadas apenas por espingarda ou carabina
Minié.
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